Recentemente diversas universidades públicas apresentaram as propostas que serão aplicadas nos Restaurantes Universitários (RU’s) ao retornarem às atividades de ensino de modo presencial. A maioria dessas propostas consistem em ou terceirizar os restaurantes universitários ou aumentar o preço das refeições, a justificativa utilizada é a falta de recursos para manter a mesma política de preços que era praticada no contexto anterior a pandemia, porém partindo de uma análise material da situação da população brasileira, que está desempregada e passando fome, e entendendo os restaurantes universitários como política de assistência estudantil voltada para garantir a permanência e a inclusão de estudantes pobres dentro dessas instituições é perceptível que até a os preços praticados anteriormente seriam insuficientes para cumprir com esses objetivos.
Estabelecendo uma comparação com o ano de 2019 nos deparamos com o seguinte cenário: segundo pesquisas do G1 o desemprego atingia 11,9% da população; pesquisas da UNICEF mostram que a fome atingia 8,4% da população. Já no ano de 2021, o desemprego cresceu e atingiu 14,2% da população, com relação à fome o número também aumentou totalizando 21 milhões de pessoas que não se alimentam de maneira adequada.
Desse modo, fica evidente a necessidade de ampliação das políticas de assistência estudantil, pois a pandemia ainda não acabou e a população brasileira vem presenciando uma piora de vida de maneira progressiva, devido ao desemprego, a retirada de direitos, a fome e a inflação. Então para que seja possível combater o modelo de universidade frequentada apenas por uma elite econômica, mais investimentos e mais políticas de permanência estudantil serão necessárias, caso contrário as velhas barreiras de acesso à educação pública serão construídas e fomentadas.
Ao se propor mais investimentos na área da educação diversas são as justificativas utilizadas por parte do governo para que isso não aconteça, a primeira delas é a ausência de recurso, sendo assim vamos analisar se de fato falta recursos, ou falta comprometimento do poder público com a educação. Segundo a auditoria cidadã da dívida pública mais de 40% do orçamento da união é destinado ao pagamento de uma dívida pública, que serve apenas para enriquecer bancos e os grandes países capitalistas, pois na prática essa dívida já foi paga e atualmente ela funciona apenas como um mecanismo de enviar recursos do Brasil para o estrangeiro.
Somado a isso, outra forma de arrecadação de recursos seria através da cobrança de impostos das grandes empresas, porém no ano de 2020 segundo a Folha de São Paulo o estado deixou de arrecadar R$34 bilhões. Com base nessas duas informações apresentadas, podemos observar que não falta recursos para a educação, falta interesse em construir uma educação pública, gratuita e de qualidade.
Isso ocorre, não por consequência de uma falta de dinheiro, mas por um projeto de sociedade, um projeto que visa tornar as universidades públicas um espaço frequentado apenas por ricos e para além disso, um projeto de fortalecer as iniciativas privadas com o sucateamento dos serviços públicos.
É possível perceber isso através da Emenda Constitucional número 95 que congelou por 20 anos os investimentos na área de saúde e educação, congelamento esse que faz com que faltem recursos para investir nessas áreas, indicando o projeto de precarização desses serviços, para se criar a necessidade da privatização. Dentro do atual sistema sempre a busca pelo lucro vai ser colocada acima da garantia da vida e de direitos básicos.
Vale ressaltar que as próprias propostas apresentadas para os restaurantes universitários partem dessa lógica, a privatização dos Restaurantes Universitários representa um grande retrocesso, não só pelos contratos precários de trabalho que serão estabelecidos, mas também pois essa política irá modificar o objetivo do R.U, antes esse espaço tinha como único objetivo garantir a permanência do estudante pobre dentro da instituição, através da garantia da alimentação. Porém, quando esse espaço passa a ser administrado por uma empresa, o seu objetivo deixa de ser a garantia da permanência e passa a ser a busca pelo lucro, uma busca que vai expulsar milhares de estudantes de todas as universidades.
As propostas de privatização dos Restaurantes Universitários e de aumento do preço das refeições, representam na prática uma continuidade do projeto do governo Bolsonaro, o projeto de expulsar estudantes pobres de dentro das universidades públicas, um projeto de tornar esses espaços lugares a ser frequentados apenas pela elite. Essa política será responsável por aumentar o número de pessoas passando fome no Brasil, será responsável por fomentar a evasão dos estudantes e pela constituição de uma enorme barreira de acesso ao ensino superior. Um dos pilares da permanência estudantil é a alimentação, qual saúde física ou mental poderemos ter passando fome? Quem poderá pesquisar, ou estudar sem se alimentar?
Essas novas políticas não afetarão apenas os estudantes, trarão consequências também para o desempenho das universidades públicas, essas universidades são responsáveis por 90% da pesquisa no Brasil, porém em um cenário que o número de estudantes irá reduzir drasticamente, e que estudantes passarão dificuldades para se alimentar, as pesquisas também serão afetadas. Não existe pesquisa, ensino, extensão sem alimentação!
Por isso, o Movimento Estudantil tem tarefas urgentes para o futuro, é necessário muita luta e organização pela recomposição do orçamento do Programa Nacional de Assistência Estudantil que há anos vem sendo sucateado e possuindo recursos retirados, devemos também lutar pela revogação da EC-95 que impede mais investimentos na educação sobre a justificativa do teto de gastos, devemos lutar pelo fim do pagamento da dívida pública que rouba nossas riquezas, contra a privatização dos Restaurantes Universitários, contra o aumento do preço das refeições e pelo Fora Bolsonaro que atualmente é o inimigo número 1 não só dos estudantes, mas de todo o povo brasileiro.
Nós do Movimento Correnteza entendemos que apesar de todos os retrocessos ainda é possível reverter essa situação, pois ao longo de toda a história o povo brasileiro enfrentou inimigos que não se preocupavam nem um pouco com nossa dignidade e sonhos e saiu vitorioso desses enfrentamentos, e na atual conjuntura também existe essa saída que é a luta todo dia, pois educação é nosso direito não é mercadoria.
Augusto César - Militante do Movimento Correnteza e Diretor de Instituições Públicas da União Estadual dos Estudantes de Minas Gerais.
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